Retinopatia Diabética. Como cuidar da visão de quem tem diabete

Redação

Uma perspectiva holística no cuidado de pessoas com Retinopatia Diabética, por Ricardo Guimarães

Retinopatia Diabética. Como cuidar da visão de quem tem diabetes?  Eu era estudante de medicina quando minha avó materna, “Vó Chiquinha” desenvolveu catarata e foi indicado cirurgia. Estudava na Faculdade de Medicina da UFMG e, naturalmente, encaminhei o caso para meu professor Hilton Rocha.

Em que pese as limitações da técnica cirurgia naquele tempo, o resultado foi muito bom. Ainda não se implantava lentes intraoculares e,  após a cirurgia de catarata, o paciente ainda usava óculos com lentes bem grossas, com cerca de 15 graus. Era uma verdadeira lupa de aumento, mas Vó Chiquinha ficou feliz. Menos de seis meses depois da cirurgia ela faleceu. E, cerca de um ano depois da Vó Chiquinha, minha avó paterna também faleceu. Ambas eram diabéticas.  Confesso que, desde então, passei a olhar o Diabetes com uma atenção muito especial.

Ao término do curso médico, optei pela oftalmologia, em muito influenciado pelo Professor Hilton Rocha, um profissional de referência nacional, mas,  mais que tudo, com uma formação médica muito aprofundada e que sempre nos estimulava a olhar o paciente como um todo, jamais fragmentado pela visão de uma subespecialidade. E o Diabetes era um exemplo da doença que exigia esta visão e abordagem.

Os casos mais graves de Retinopatia Diabética  geralmente desenvolvem hemorragia na retina. Se não tratados,  estas hemorragias produzem um necrose na retina na área em que se localizam. O tratamento, muito eficaz, Eé feito com raio laser. O laser destrói o sangue acumulado na hemorragia, mas leva junto também aquela região da retina. Por segurança, aplicamos o laser na região vizinha para nos certificarmos da completa excisão da área evitando uma necrose regional. Nossa conduta foi sempre o de orientação do paciente para uma mudança de estilo de vida e procura de orientação com um colega endocrinologista para controle do diabetes, sem o que, dentro de algum tempo ele estará de retorno para mais uma aplicação de laser na retina e consequentemente com perda de mais uma área de visão.

Este e um pequeno exemplo de conduta holística, de visão do paciente como um todo e não apenas do seu quadro ocular.
A edição da revista Ophthalmology, da Academia Americana de Oftalmologia nos traz em seu editorial, o título:  Uma perspectiva holística no cuidado de pessoas com retinopatia diabética.” Não poderia ser mais oportuno para a visão de medicina integrativa, holística. E que nos permita desenhar uma estratégia abrangente de gerenciamento da doença, facilitando a abordagem e atendimento holístico que abrange detecção e intervenção precoce dos casos, e acompanhamento contínuo, desde a fase inicial.

O Diabetes é hoje foco de muita atenção da comunidade oftalmológica. Aprendemos muito nos últimos anos e a indústria desenvolveu novas tecnologias que nos permitem diagnosticar mais precocemente através do exame da visão, da retina, em tempo muitas vezes de evitar o desenvolvimento das consequências terríveis do diabetes, entre eles de perda da visão.

O artigo destaca novas técnicas de exame usando o OCT (Tomografia Ótica da Retina) que certamente beneficiara a vida dos cerca de 463 milhões de pessoas com diabetes no mundo.

O uso de tecnologia de ponta, aliado a educação do paciente,  é fundamental para esta abordagem. A proporção de pacientes com diabetes não diagnosticados pode chegar a 50% em algumas regiões do Brasil. Além disso, nem todas as pessoas diagnosticadas com diabetes são encaminhadas para um exame oftalmológico. Por sua vez, nem todos os encaminhados acessam o atendimento oftalmológico com dilatação da pupila e exame cuidadosos da retina central e periférica em busca das lesões típicas do diabetes.

A proporção daqueles que acessam cuidados oftalmológicos varia com a região do paciente. E mais fácil nos grandes centros onde os centros de oftalmologia são mais equipados e temos mais especialistas. Mas o problema afeta também outros países considerados ricos.
De acordo com a Academia Americana de Oftalmologia, “sessenta por cento dos americanos com diabetes cabulam os exames anuais de rotina da visão”. E nos países em desenvolvimento, a proporção que acessa cuidados oftalmológicos é muito menor tornado o manejo do diabetes mais difícil e o sucesso do tratamento ainda menor.

O enfoque do artigo é epidemiológico, de visão de saúde pública, mas podemos e devemos aplicar o conceito para ecossistemas menores, mais locais ou regionais.
Para conseguirmos abordar a doença de forma mais eficientes, e com menos gastos, precisamos promover o aumento da adesão aos exames oftalmológicos anuais de retinopatia diabética.
Na maioria das situações, o primeiro grande desafio é prevenir a ocorrência de diabetes, seguido de garantir que todas as pessoas diagnosticadas com diabetes sejam submetidas a um exame da retina central e periférica e, posteriormente, fazê-las seguir as orientações fornecidas. Parte disso parece estar fora do escopo da oftalmologia, mas incursões podem ser feitas quando os oftalmologistas procuram os profissionais de saúde da linha de frente. O que está diretamente dentro do alcance dos prestadores de cuidados oftalmológicos é garantir a adesão a tudo o que é aconselhado, incluindo exames oftalmológicos de acompanhamento, especialmente da família. Embora o sucesso nisso exija uma abordagem multifacetada, tudo se resume a reduzir o esforço e o custo para o paciente.

Novas tecnologias estão sendo desenvolvidas para apoiar este trabalho, facilitando não apenas o diagnóstico, mas também seu acompanhamento nos permitindo a detecção de mudanças e progressão na doença. À medida que os esforços atuais na construção de dispositivos de uso doméstico e sistemas de imagem de baixo custo se concretizam, será muito mais viável fornecer serviços avançados de diagnóstico em níveis locais e até mesmo nas casas dos pacientes. A redução resultante no custo e esforço dos pacientes aumentará a eficácia do gerenciamento de casos, adesão e atendimento.

Enquanto nós não atingimos este patamar, é  necessário orientar nossos pacientes para o exame periódico de visão, com exame da retina central e periférica sob dilatação, uso do OCT de rotina, e orientação apropriada do paciente e da família para procura do endocrinologista ou clinico para eventual medicação e orientação e educação de hábitos alimentares.

Prevenir, evitar é sempre melhor do que tratar.

E você, tem feito seu exame de rotina ou está fazendo roleta russa com seus olhos?

Acesse este próximo artigo e conheça mais sobre a história da Vovó Chiquinha e de como ela conseguiu promover uma revolução da cirurgia de catarata.

Este artigo tentou aproveitar ao máximo os conceitos e o texto do artigo “A Holistic Perspective in Caring for People with Diabetic Retinopathy ” – Thulasiraj Ravilla, American Academy of Ophthalmology – 128, ISSUE 4, P574-575, APRIL 01, 2021