Como a visão pode ajudar crianças a vencer o medo de dentista?
Descubra neste artigo como a visão pode ajudar crianças a vencer o medo de dentista.
Uma pesquisa inovadora que utiliza rastreamento ocular, abriu um caminho fascinante para uma compreensão mais profunda das preferências visuais das crianças quando elas vão ao dentista. E estas descobertas podem revolucionar a maneira como os dentistas se apresentam e interagem com seus pacientes infantis.
Ficou curioso? Não perca a chance de explorar os resultados e implicações desta pesquisa incrível. Aproveite o artigo na íntegra!
Para escrevermos este artigo, conversamos com dois especialistas. O primeiro foi o oftalmologista, referência nacional na área, Dr. Ricardo Guimarães do HOlhos de Minas Gerais e diretor de Pesquisas do LAPAN. E o Dr. Ricardo explica como é possível fazer este rastreamento ocular e saber para onde as crianças olham quando vão ao dentista.
“Existe um aparelho chamado Eye Tracker que é usado no Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães para documentar a movimentação sacádica dos pacientes. Este equipamento nos permite capturar informações valiosas sobre a movimentação dos olhos, fornecendo insights importantes para entender o funcionamento ocular”.
Dr. Ricardo Guimarães ainda ressaltou que os distúrbios como problemas de leitura, déficit de atenção, dislexia e até mesmo traumatismo craniano podem ser identificados com o auxílio dessa tecnologia inovadora. Mas as surpresas não param por aí! O rastreamento ocular também revela objetos, pessoas ou partes de uma pessoa que chamam a atenção em uma cena específica.
E foi usando esta tecnologia que um grupo de pesquisadores australianos, liderados pelo renomado dentista pediátrico Dr. Gregory Celine, foi além e buscou desvendar o mistério: para onde olha uma criança ao ver um dentista? Este estudo fascinante abriu caminho para uma compreensão mais profunda das preferências visuais das crianças e pode explicar e até revolucionar a maneira como os dentistas se apresentam e interagem com seus pacientes infantis.
Como foi realizado o estudo
Os autores empregaram um sistema de rastreamento ocular (Eye Tracking), semelhante a um mapa de calor que mostra as áreas mais observadas em uma imagem. Essa técnica permite que os pesquisadores identifiquem onde as crianças concentram seu olhar, fornecendo informações valiosas sobre suas preferências e percepções.
Métodos: Um grupo de 40 crianças (21 meninas e 19 meninos, com idades entre 4 e 12 anos) observou 10 imagens de dentistas de diferentes gêneros, etnias e vestimentas, apresentadas em uma tela de computador. Uma câmera de rastreamento ocular Tobii X2-60 foi utilizada para monitorar a direção do olhar dos participantes enquanto observavam as imagens. Áreas de interesse (AOIs) foram pré-definidas em cada imagem (por exemplo, olhos, boca, roupa). Imagens distrativas foram intercaladas entre as fotos dos dentistas para evitar a sequência contínua de imagens de profissionais.
Resultados:
Rosto e roupa: A análise visual demonstrou que o rosto do dentista recebeu a maior quantidade de fixações oculares, seguido pela roupa.
Boca e Olhos: A área ao redor da boca atraiu significativamente mais fixações do que os olhos, o que pode ser atribuído à comunicação não verbal.
Expressões: As crianças, mesmo em tenra idade, são sensíveis às expressões faciais e podem associá-las a emoções e intenções.
Significado clínico: Essa pesquisa fornece uma compreensão inédita sobre onde as crianças se concentram ao olhar para um dentista, o que pode levar a melhorias na forma como os profissionais se apresentam e interagem com os pacientes infantis. Estudos anteriores mostram que a aparência do dentista, incluindo a cor do jaleco, pode influenciar a percepção das crianças. Por exemplo, jalecos coloridos ou com personagens infantis podem ajudar a criar um ambiente mais amigável e acolhedor para os pacientes jovens.
A importância da primeira impressão pode ser comparada à capa de um livro. Embora não seja correto julgar um livro pela capa, é inegável que a aparência externa influencia a percepção e as expectativas das pessoas. No caso dos dentistas, a aparência pode afetar a relação com os pacientes infantis e, consequentemente, o sucesso do tratamento.
Empatia e habilidade de se comunicar com crianças são competências fundamentais para os dentistas que atendem pacientes infantis. A compreensão das preferências visuais das crianças pode ajudar os profissionais a se adaptarem e estabelecerem uma conexão emocional positiva com seus pacientes.
A aplicação do rastreamento ocular em outras áreas da medicina também tem mostrado resultados promissores. Essa técnica tem sido empregada para estudar como os médicos observam imagens de diagnóstico, como radiografias e tomografias, e para investigar o processo de tomada de decisão clínica.
Como este estudo pode ajudar a combater o medo que as crianças têm de dentistas?
O termo “medo e ansiedade odontológica”, ou seja, o clássico medo de dentista, refere-se aos sentimentos negativos associados ao tratamento odontológico entre crianças e adolescentes. Estima-se que cerca de 9% das crianças apresentam medo e ansiedade odontológicos, sendo mais comum entre os pacientes mais jovens. Problemas de manejo do comportamento odontológico, como comportamentos não cooperativos e disruptivos, podem resultar em atrasos no tratamento ou impossibilitar sua realização.
A importância dos fatores dentários, como dor ou percepção de falta de controle durante o tratamento, tem sido amplamente relatada. No entanto, a maioria dos aspectos do comportamento infantil no consultório do dentista, como apego, reatividade temperamental e regulação emocional, tem sido pouco investigada. Esses fatores não odontológicos apresentam grande potencial para desvendar os aspectos críticos que levam ao desenvolvimento de medo e ansiedade odontológica e problemas de gerenciamento de comportamento odontológico em crianças e adolescentes.
A primeira impressão do dentista é importante para formar uma relação positiva criança-dentista, o que é essencial para permitir que os dentistas forneçam um alto padrão de atendimento odontológico a seus pacientes jovens.
E para validar esta conclusão dos pesquisadores australianos, a equipe do VPoF conversou com a Dra. Cristiane Braga, Cirurgiã-Dentista, mestre e doutoranda em Odontopediatria pela UFMG.
Dra. Cristiane esclarece que existem técnicas de manejo comportamental e uma das mais utilizadas é a do mostrar, falar e fazer. Há também técnicas de distração onde podem ser utilizados balões, brinquedos e, como disse o estudo, o jaleco, a roupa que faz parte do EPI obrigatório do dentista, pode ser um elemento eficaz de distração quando utilizadas estampas coloridas, lúdicas e divertidas.
Dra. Cristie, como é chamada pelos seus pacientes mirins, ainda reforça que também sempre adotou a técnica de pedir para o paciente olhar para ela, ao notar que a criança estava mais ansiosa e com aquele medo de dentista. “Eu vejo que o paciente está sentindo aquele medo de dentista e falo: vem cá. Olha para mim, vamos fazer isto juntos…Isso eu sempre fiz de uma maneira intuitiva, mas na literatura tem um respaldo com relação a esta técnica. Quando você busca o olhar do paciente para o seu olhar, isso acalma.”
Então, resumindo o nosso artigo de hoje, chegamos a seguinte conclusão: o rastreamento ocular na odontologia fornece informações valiosas sobre onde as crianças olham ao ver um dentista, o que pode levar a melhorias na forma como os profissionais se apresentam e interagem com os pacientes infantis. Ou seja: a compreensão dessas preferências visuais pode contribuir para a redução da ansiedade e do medo odontológico e melhorar a experiência das crianças no consultório odontológico.
Leia neste próximo artigo como estimular a visão e a criatividade na escola.